segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Porque não fui ao México


Em junho a AME foi convidada a participar do Terceiro Congresso Latinoamericano de Associações de Esclerose Múltipla, que se realizaria entre 26 e 28 de setembro no México. Iríamos eu e o Gustavo, nosso superintendente (meu irmão de coração e compadre). Só não aceitei o convite na hora porque precisava conversar em casa e ver se todos topavam, afinal, a responsabilidade dos cuidados diários do Francisco, meu filho de 9 meses, teria que ser compartilhada por quem ficasse. Todos aqui em casa toparam e assim, aceitei com muita alegria o convite. Seria maravilhoso discutir esse tema que me é tão caro com pessoas que também trabalham em prol da conscientização e de melhor qualidade de vida para quem tem esclerose múltipla, num dos top 10 de países que quero conhecer.
Fui me preparando psicologicamente nos últimos meses para ficar longe do meu filho por uma semana. Já estava mais calma com isso quando entrou setembro, e mesmo tendo tido um terremoto no México no dia 08 de setembro, estava tranquila, afinal, tinha sido longe da cidade onde eu ficaria. Rezei pelos 98 mortos e suas famílias e continuei meus dias, aguardando mais notícias sobre o evento.
No dia 19 de setembro houve o segundo terremoto. Esse assustou muito mais. As imagens de prédios caindo como se tivessem sido implodidos, as pessoas desesperadas tentando achar seus familiares, os relatos em blogs, twitters e facebooks de tristeza, dor e pânico. As horas foram passando e o número de mortos aumentando. Em alguns lugares li que tinham confirmado a morte de 310 pessoas. Foi aí que comecei a repensar minha viagem ao México.
Não pelo medo de novos abalos sísmicos (que há também), nem por achar que eu poderia ser uma vítima de um terremoto (o que é possível também), mas na hora passei a pensar que esse é o momento do país voltar-se para si e reconstruir-se. É um momento de luto coletivo. Mais de 400 pessoas perderam suas vidas em menos de um mês. Eu não me sentiria bem indo até lá para me divertir, comer, tomar água, usar energia elétrica sabendo que milhares de pessoas estão sem casa, sem provisões, procurando seus entes queridos e chorando seus mortos.
O Encontro ocorreria em Veracruz, território não atingido fisicamente pelo terremoto. Mas, vejam bem, fisicamente apenas. Porque emocionalmente, quando morrem mais de 400 pessoas no Estado vizinho, não existe forma de se manter bem psicologicamente. Boca Del Rio, cidade onde aconteceria o evento fica a cerca de 400km de distância de Cidade do México, lugar mais acometido pelo terremoto. Eu moro em Porto Alegre, cidade que fica em torno de 320km distante de Santa Maria, cidade onde há 4 anos 242 jovens morreram e outros 600 se feriram em um trágico incêndio. Eu não conhecia nenhum dos jovens que lá estavam, mas fiquei chocada e por dias paralisada. Cada vez que tentava trabalhar, pensava nesses jovens, nessas vidas, nessas mães, pais, irmãos, filhos, amigos. Todos os eventos no Estado foram desmarcados em respeito a essa dor. Uma dor que atingiu todos nós de alguma forma.
Não conheço o povo mexicano, mas não preciso conhecer para saber que está doendo. Não preciso conhecer sequer uma pessoa de lá (apesar de conhecer e gostar muito e de ter ficado aliviada ao saber que estavam bem após o abalo sísmico) para me solidarizar com essa dor.
E foi por isso que decidi ficar em minha casa, com meu filho, minha família e trabalhando pelas pessoas com Esclerose Múltipla. Havia decidido isso antes de ocorrer o terceiro (sábado) e o quarto terremoto (domingo). Acredito que esse não seja o momento para nos reunirmos e discutir a EM lá. Quem sabe em outro momento sim. Com certeza um dia irei. Mas não hoje. Só iria se eu pudesse ajudar de alguma forma naquilo que hoje o México precisa. E hoje, vejo que minha ajuda será em forma de orações. Tão logo seja possível, podemos pensar novamente em realizar meu sonho de conhecer esse país que tanto admiro. Mas hoje fico na torcida para que todos fiquem bem e que consigam permanecer em pé, mesmo com as estruturas físicas ruindo. Acredito que hoje o povo mexicano precisa se unir para ajudar a si mesmo, e não para servir turistas. Sei que, provavelmente as provisões que seriam destinadas a mim não serão levadas a quem realmente precisa no país. Mas me sentiria muito mal em comer, beber, tomar banho e passear sabendo que o país está em estado de emergência por conta de uma catástrofe que atingiu boa parte das pessoas fisicamente e a todos emocionalmente.
Aí as pessoas podem dizer: ah, mas você diz isso também porque está com medo de ir! Não posso negar que após 4 abalos em um mês há sim o medo de ser atingida pelos efeitos de um terremoto. Sou mãe de um bebê de 9 meses que depende de mim pra tudo. Ele é minha maior responsabilidade e não posso ir para um lugar que não me garante a volta. Não que eu ache que vá morrer lá soterrada (o que é possível), mas se o aeroporto for afetado, eu teria que ficar longe da minha família por tempo indeterminado, além de ficar sem o tratamento para a minha esclerose múltipla. Para que eu continue trabalhando pela EM, eu tenho que estar bem. E, ficar longe do meu filho, certamente me adoeceria. E sempre que eu puder evitar a doença em meu corpo, eu evitarei. Então, sim, é medo também. Medo meu e daqueles que me amam.
Até o momento o Encontro não foi cancelado. E eu espero que, se ele acontecer, que seja muito proveitoso e que traga muitos bons resultados para todas as Associações de Esclerose múltipla da América Latina. Só que dessa vez não estarei lá para aprender com os/as demais colegas nem poderei compartilhar daquilo que conheço. Outras oportunidades aparecerão e poderemos compartilhar e confraternizar com alegria. Hoje meu coração está com o povo mexicano, minhas orações estão com o povo mexicano, mas minha presença fica em casa, porque não é preciso estar perto para estar junto.

Posicionamento oficial AME: http://www.amigosmultiplos.org.br/noticia/978/ame-desiste-participar-congresso-sobre-em-mexico-por-seguranca

3 comentários:

  1. Não esperava outra atitude tua e da AME, que não fosse essa. Um beijão e conte sempre comigo para o que precisar. Beijão pro Francisco também ♡♡

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  2. Com certeza Bruna, não seria o momento.
    Parabéns pela tua atitude e posicionamento e da AME!
    Beijinhos querida e dá um beijão no meu amorzinho, Francisco 💚❤️

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  3. Entendo perfeitamente o que você quis dizer. Sinto este sofrimento também quando sei que outras pessoas estão sofrendo. E é muito difícil ficar longe de quem amamos. É bom, nós que temos EM, evitarmos ficar doentes.

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